Certo. Cedi. Guardo na gaveta o papel e a caneta predileta, e deixo dissolver cloridricamente o apego.
Gosto de escrever só com o pensamento, sem anotar nada. Gosto de correr com as palavras, pra ver se elas me alcançam.
Um dia, eu vou pensar, e o poema se há de traduzir, transliterar e registrar sozinho. A mente é mais rápida que a linguagem.
Um dia, vou parir um poema que não terá verso. A métrica e a rima já as abandonei há tempos; no meu próximo poema vou deixar também o verso. Não haverá palavra.
Não haverá imagem. Nem som. Nem forma.
Mas será todo uma metáfora, um despejamento de luz gratuito e não traduzido, não contido, não mediado, sem rédea nenhuma. Um poema nu.
Um poema plural, o sentimento poético inteiro, sem o filtro das poucas palavras que conheço. Será um poema sobre-humano? Ou justamente por não me passar pelas mãos, falaria abertamente de minha humanidade? Gesto este poema. Quando lher der à luz, será ele quem me iluminará. Sem versos me iluminará. Que destas orgias em meu cérebro nasça um rebento de luz!
Que assim seja e continue sendo!
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